quinta-feira, 2 de abril de 2015

Redução da maioridade penal como solução para a violência no Brasil? Santa e doce ignorância!


Sim, eu sou Assistente Social, sim, eu sou militante, sim, eu luto pelos Direitos Humanos. Não, eu não “passo a mão” na cabeça de bandido, não, eu não acredito que pessoas que cometeram crimes não devam ser responsabilizadas por isso. E sim, eu sou contra a redução da maioridade penal!

Adolescentes com 16, 17 anos estão em fase de desenvolvimento, ainda em processo de escolarização e início de uma trajetória profissional. Que tipo de argumento é esse, que as pessoas favoráveis a redução da maioridade penal usam, alegando que um menino ou uma menina de 16 anos “sabe muito bem o que está fazendo”? Eles/elas podem saber e podem não saber! Assim como vejo pessoas com 30, 50, 60 anos, que cometem atos dos mais diversos graus de violência e complexidade, e parecem não saber o que estão fazendo. O fato de você achar que essa pessoa já tem consciência da gravidade dos seus atos não justifica a redução da maioridade penal e, mais importante do que isso, o fato de adolescentes serem presos com 16 anos, não significa a redução da violência no país!


Adolescentes em conflito com a lei podem ser “punidos” com seis diferentes formas de medidas socioeducativas, conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu Capítulo IV, seção I, Art. 112: advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semi-liberdade; internação em estabelecimento educacional; e inclusão em medidas de proteção (conforme Art. 101). Adolescentes já são punidos pelos seus atos e, nos casos mais graves ou em situações de reincidência, sofrem medidas de restrição de liberdade que podem ter duração de até 3 anos.

Infelizmente, as instituições onde esses meninos e meninas cumprem as medidas de privação de liberdade não são as mais adequadas e, muitas vezes, sofrem com situações de superlotação e espaços físicos precários (como também vemos acontecer na maioria dos presídios brasileiros). Mas elas existem e, apesar de toda fragilidade, garantem (ou deveriam garantir) o atendimento adequado a esses adolescentes, para que direitos básicos como saúde e educação não sejam violados e para que a reinserção na sociedade seja mais afetiva.

Esse espaço existe, com a proposta de um trabalho diferenciado, para que o resultado seja melhor, tanto para o adolescente quanto para a sociedade, mas o que vemos no nosso país, atualmente, são políticos que não lutam pela continuidade desse atendimento, não lutam pela oferta de educação, saúde, lazer, cultura e formação profissional para nossas crianças e adolescentes, não lutam pela garantia dos direitos dispostos no ECA, para que alcancem toda a população de 0 a 17 anos. O que vemos são políticos, e uma sociedade civil preconceituosa e imediatista, querendo jogar para baixo do tapete um problema de pobreza e desigualdade social que é estrutural. Políticos e pessoas comuns que preferem “lutar” pelo encarceramento de adolescentes, pelo aumento da população nos “depósitos de gente” que já são nossos presídios, achando que essa atitude poderá ser capaz de resolver o problema da violência no Brasil. Santa e doce ignorância!


Por que ninguém se preocupa com a condição de vida da família e da comunidade de onde é a origem da maioria dos adolescentes em conflito com a lei? Por que ninguém se preocupa com a mãe que, após ser abandonada pelo “marido”, precisa trabalhar e criar 3, 4, 5 filhos/as sozinha? Por que ninguém pensa que, enquanto ela trabalha como babá na casa de outra família, os/as filhos/as dela estão, muitas vezes, sozinhos/as? Por que ninguém culpabiliza o traficante que alicia essas crianças e adolescentes? Por que adolescentes de famílias ricas que, muitas vezes cometem crimes iguais ou piores que adolescentes pobres, não sofrem o mesmo tipo de punição? Por que ninguém se preocupa com a qualidade da saúde e do ensino público? POR QUE NINGUÉM, NENHUM POLÍTICO, ESTÁ BRIGANDO PARA QUE OS DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES SAIAM DO PAPEL? 

Um país melhor, com baixos índices de violência, é construído a partir de políticas públicas que garantam direitos e não de medidas punitivas, para cidadãos cada vez mais novos, que apenas privem-os de liberdade, num sistema carcerário falido e perpetuador de práticas de violência. Um país melhor se faz com distribuição de renda e garantia de direitos. Um país melhor se faz escutando o que nossas crianças e adolescentes têm para nos dizer e, principalmente, RESPEITANDO-AS/OS!

Referências:

http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2013/04/pela-ampliacao-da-maioridade-moral.html

http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1430